terça-feira, 4 de janeiro de 2011

PSICOMOTRICIDADE E ESCRITA

As variadas definições de psicomotricidade se assemelham pela afirmação da relação movimento e intelecto. Destacaremos a seguir definições que assinalam essas características.

Para Alves (2007), a psicomotricidade é um termo usado para classificar o movimento organizado e integrado, empregando as experiências vividas pela criança e está ligada ao processo de maturação, na qual o corpo é considerado a origem das aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. Além disso, é uma ciência que tem como objeto de estudo o homem e seu corpo em movimento, levando em consideração seu mundo interno e externo.
De acordo com Fonseca (1995), a psicomotricidade é um meio de ajustamento perceptivo-motor que se utiliza de processos mentais, fundamentais para a ação preventiva e terapêutica das dificuldades de aprendizagem. É conhecida como a integração superior da motricidade, produto de uma relação inteligível entre a criança e o meio, que traduz a relação entre sua atividade psíquica e motora (SANCHES et al, 2004).
O desenvolvimento psicomotor deveria ocorrer de maneira mais evidente na infância, por parte dos educadores. Infelizmente, a atual situação é oposta; pois a falta de estímulo psicomotor é gritante no âmbito escolar. Fonseca (1987, p. 21 citado por PEREIRA, 2005) revela que:

[...] a ausência de espaço e a privação de movimento é uma verdadeira talidomida da atual sociedade, continuando na família (urbanização) e na escola. A não-aceitação da necessidade de movimento e da experiência corporal da criança põe em causa as atividades instrumentais que organizam o cérebro (FONSECA, apud PEREIRA, 2005, 21).

O autor mostra que as atividades psicomotoras podem ser consideradas a base os demais aprendizados escolares. Ferronatto (2006) destaca essa ligação entre o motor e o intelectual envolvidos na psicomotricidade, explicando que ela é “[...] um caminho, é o desejo de fazer, de querer fazer e de poder fazer, e que o homem não é exclusivamente um ser motor [...] não é exclusivamente um ser psíquico [...] o homem é psicomotor” (p.51).
Le Boulch (1992, p. 25) ressalta que a psicomotricidade ajuda a criança a compreender o mundo, por meio de uma organização intermediada pelo próprio corpo: “[...] A educação psicomotora deve constituir um privilégio desde a mais tenra infância, conduzida com perseverança, permite prevenir certas inadaptações difíceis de melhorar quando já estruturadas [...]”. A educação psicomotora é usada como forma de prevenir as dificuldades escolares e na reeducação de casos em atraso motor. Portanto, o papel da psicomotricidade é proporcionar a criança uma vivência corporal, desenvolvendo aspectos cognitivos e afetivos para esta aprendizagem.
De acordo com Negrine (1980), uma das aprendizagens escolares básicas devem ser os exercícios psicomotores e sua evolução é determinante para a aprendizagem da escrita e da leitura. Outros estudos destacam a necessidade de, desde o ensino pré-escolar, ser oferecidas atividades motoras direcionadas ao fortalecimento e consolidação das funções psicomotoras, importantes para o êxito nas atividades da leitura e escrita, como apontado por Furtado (1998), Nina (1999), Cunha (1990), Oliveira (1992) e Petry (1988). Dentre os estudos citados, Petry (1988) destaca que as dificuldades de aprendizagem em crianças de inteligência média podem se manifestar quanto à caracterização de letras simétricas pela inversão do “sentido direita-esquerda”, como, por exemplo, b, p, q ou por inversão do “sentido em cima em baixo”, d, p, n, u, ou, ainda, por inversão das letras oar, ora, aro.
Para Negrine (1980, p. 61), as dificuldades de aprendizagem vivenciadas pelas crianças “são decorrentes de um todo vivido com seu próprio corpo, e não apenas problemas específicos de aprendizagem de leitura, escrita, etc.” Nessa afirmação, a autora deixa claro que os aspectos psicomotores exercem grande influência na aprendizagem, pois as limitações apresentadas pelas crianças na orientação espacial podem tornar-se um fator determinante nas dificuldades de aprendizagem.
Ajuriaguerra (1988) afirma que a escrita é uma atividade que obedece a exigências precisas de estruturação espacial, pois a criança deve compor sinais orientados e reunidos de acordo com normas, a sucessão faz destes sinais palavras e frases, tornando a escrita uma atividade espaço-temporal.
Conforme Fonseca (1995b), um objeto situado a determinada distância e direção é percebido porque as experiências anteriores da criança levam-na a analisar as percepções visuais que lhe permitem tocar o objeto. É dessas percepções que resultam as noções de distância e orientação de um objeto com relação a outro, a partir das quais as crianças começam a transpor as noções gerais a um plano mais reduzido, que será de extrema importância quando na fase do grafismo. Em outra obra (FONSECA, 1983), o autor assinala que na aprendizagem da leitura e da escrita a criança deverá obedecer ao tempo de sucessão das letras, dos sons e das palavras, fato este que destaca a influência da estruturação temporal para a adaptação escolar e para a aprendizagem.
Segundo Tomazinho (2002, p. 50), o desenvolvimento corporal é possível graças a movimentos, percepções, expressões e brincadeiras corporais dos indivíduos. As experiências e brincadeiras corporais assumem um papel fundamental no desenvolvimento infantil, pois enfatizam a valorização do corpo na constituição do sujeito e da aprendizagem, assim a “[...] pré-escola necessita priorizar, não só atividades intelectuais e pedagógicas, mas também atividades que propiciem seu desenvolvimento pleno”.
De acordo com Oliveira (1996, p. 182), a psicomotricidade contribui para o processo de alfabetização à medida que procura proporcionar ao aluno as condições necessárias para um bom desempenho escolar, permitindo ao sujeito que se assuma como realidade corporal e possibilitando-lhe a livre expressão. A psicomotricidade caracteriza-se como uma educação que se utiliza do movimento para promover aquisições intelectuais. Para a autora, a inteligência pode ser considerada uma adaptação ao meio ambiente e para que esta aconteça é necessário que o indivíduo apresente uma manipulação adequada dos objetos existentes ao seu redor, “[...] esta educação deve começar antes mesmo que a criança pegue um lápis na mão [...]”.
Fávero (2004) ressalta que o desenvolvimento psicomotor não é o único fator responsável pelas dificuldades de aprendizagem, mas um dos que pode desencadear ou agravar o problema. As dificuldades de aprendizagem relacionadas à escrita alteram o rendimento escolar. Crianças com dificuldades de escrita podem apresentar disfunção nas habilidades necessárias para a aprendizagem escolar em outras áreas do conhecimento fatores, estes que, podem ser acentuados pelos déficits psicomotores. A escrita exige o desenvolvimento de habilidades psicomotoras específicas e um esforço intelectual superior às aprendizagens anteriores à fase do letramento da criança. Na escrita ocorre a comunicação por meio de códigos que variam de acordo com a cultura, e sua aprendizagem se dá por meio da realização de atividades tanto espontâneas como sistematizadas.
Segundo Fávero (2004), a escrita espontânea envolve um grau maior de dificuldade, pois o modelo visual e auditivo está ausente e envolve a tomada de decisões acerca do que vai ser escrito e como será escrito. Antes do indivíduo escrever é preciso gerar uma informação, organizá-la de forma coerente para posteriormente escrevê-la e revisar o que foi escrito. É preciso diferenciar as letras dos demais signos e determinar quais são as letras que devem ser empregadas. Além disso, a escrita pressupõe um desenvolvimento motor adequado, pois certas habilidades como a espacial e temporal são essenciais para que essa atividade ocorra de maneira satisfatória.
Os estudos de Fávero (2004) confirmam as conclusões anteriores de Ajuriaguerra (1988), Ferreiro (1985) e Cagliari (2000), que ao estudarem a aquisição da escrita, constataram que esta aquisição não deve ser restrita a simples decodificação de símbolos ou signos, pois o processo de aquisição da língua escrita é complexo e anterior ao que se aprende na escola.
A escrita envolve, segundo Ajuriaguerra (1988), além das habilidades cognitivas, as psicomotoras, uma vez que o ato de escrever está impregnado pela ação motora de traçar corretamente cada letra e constituir a palavra. Quando se coloca em questão o desenvolvimento motor é necessário, além da maturação do sistema nervoso, a promoção do desenvolvimento psicomotor, objetivando o controle, o sustento tônico e a coordenação dos movimentos envolvidos no desempenho da escrita.

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